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Archive for 08/08/2011

7º GAC – Uma Gloriosa Unidade Militar Resplandece da Tragédia.

 O 7º Grupo de Artilharia de Campanha (7º GAC) é das mais tradicionais Unidades Militares do Estado de Pernambuco e a principal de cidade de Olinda. Sua história é uma verdadeira epopéia. Criado pelo Decreto-lei  Nr 4.342, de 26 maio de 1942, como 7º Grupo de Artilharia de Dorso (7º GADo), teve seu efetivo enviado do Rio de Janeiro para Pernambuco nos vapores Baependi e Itagiba, que foram torpedeado pelo U-Boot 507 em 15 e 17 de agosto de 1942, respectivamente.

Naquele histórico e dramático momento, pereceram 153 militares que iriam constituir o 7º GADo, dentre eles o Major LANDERICO DE ALBUQUERQUE LIMA, comandante da tropa em deslocamento.

Segue abaixo o relato do Capitão Lauro Reis e publicado em 1948, no livro “Seleção de Seleções”, uma coletânea de artigos publicados na revista “Seleções do Reader’s Digest”.

“Deixamos o porto de Salvador, Bahia, às sete horas da manhã, rumando para o norte. Do Rio até ali o mar tinha estado calmo. Agora se apresentava picado, espumoso, com fortes marolas, e o velho Baependi arrastava-se, moroso, balançando desagradavelmente.

O vapor ia repleto — umas trezentas e cinqüenta pessoas, incluindo a tripulação e uma unidade do Exército, cujos componentes — oficiais e soldados — iam acompanhados de suas famílias, algumas com muitas crianças.

Como esse dia — 15 de agosto — era o aniversário natalício do comissário de bordo, um excelente homem, o jantar foi festivo, a orquestra tocou animadamente e a alegria reinou a bordo até bastante tarde. Enquanto no salão se dançava, lá fora na popa, os soldados, — quase todos cariocas — montados em canhões e grandes caixas, reunidos em grupos, tocando pandeiros e batendo em latas, cantavam seus sambas à moda do morro…

Noite fechada, as luzes todas apagadas, navegávamos a umas 20 milhas da costa, quando súbito um tremendo estampido sacode violentamente o velho barco. Quebram-se as vidraças; o madeiramento range, estala, racha e, arremessados por forças invisíveis, voam estilhaços de vidro e madeira para todos os lados. Caem as primeiras vítimas, e há diversas pessoas com o rosto sangrando, devido a ferimentos provocados por fragmentos de vidro.

As máquinas param, o vapor altera o rumo abruptamente, e somos jogados pela inércia, com força, para a frente.

O primeiro instante deixa todas as pessoas imóveis de espanto, a respiração suspensa, as fisionomias pálidas e angustiadas… Não há gritos; nenhum pânico. Percebe-se em cada um o esforço mental para entender o ocorrido, para buscar uma solução, pressentindo a gravidade do terrível momento…

Estou no vestíbulo, de onde partem as escadas para o deck superior e para os camarotes de baixo. Tomado de surpresa, tenho imediata intuição do sucedido: fomos torpedeados ! Logo a seguir, ouço o apito surdo do navio, pedindo socorro… O Baependi começa a adernar.

Corro ao meu camarote ali perto, empurro a porta, que felizmente não ficou emperrada, apanho rápido o meu salva-vidas, e saio.

Há muitas pessoas no vestíbulo; umas, principalmente mulheres e crianças, paradas, como se esperassem que uma providência alheia as salvasse; outras caminhando febrilmente, na direção em que julgam poder encontrar salvamento. O navio aderna mais e mais; só podemos andar, agora, agarrados às paredes.

Alguns descem com dificuldade as escadas para os camarotes inferiores, em busca de salva-vidas, ou para se reunir às suas famílias; infelizmente, para não voltarem mais… Ficarão na companhia dos que nem sequer conseguiram sair dali.

Vejo tudo isso de relance e, ainda enfiando o cinto salva-vidas, subo a escada para o deck de cima, em busca da minha baleeira; agarrado ao corrimão, chocando-me com pessoas que descem, aturdidas, estou quase no alto, quando um segundo torpedo explode, abalando fragorosamente todo o navio. O corrimão, ao qual me agarrava, fica feito em frangalhos, e rolo na escada, de costas, aos trambolhões, até a porta do refeitório, de onde saíra. Entre o primeiro e o segundo torpedos, não decorreram mais de trinta segundos.

As luzes se apagam; esbarramos uns nos outros, desorientados, no meio de profunda escuridão. O navio aderna consideravelmente, já sendo impossível, agora, andar de pé.

O segundo torpedo foi o tiro de misericórdia. O Baependi agoniza… Percebo que o afundamento vai ser rápido. Esforço-me por sair do interior. Um cheiro sufocante e enjoativo, proveniente da explosão, invade tudo.

Tateando, com grande esforço consigo agarrar-me à escada e, de restos, segurando-me nas saliências, vou subindo devagar.

Na escuridão, apenas distingo, numa pequena claridade vinda de fora, o contorno de uma porta, ao fim da escada que tento subir. É preciso atingí-la a todo custo, porque senão eu afundarei dentro do navio. Mais um esforço e consigo chegar.

O navio, nesse momento, está quase de lado: o que era parede passou a ser chão. Atravesso aquela porta com os movimentos de quem, pela abertura do teto, passa para o forro de uma casa.

Alcanço a baleeira em frente à porta. Presa aos turcos, num emaranhado de cordas, alguns marinheiros tentam soltá-la. Não trocamos palavra. Começo a ajudá-los, procurando desvencilhar cordas, febrilmente.

Mas é inútil: o Baependi continua a afundar-se vertiginosamente ! As ondas revoltas quase nos atingem e ouço, bem perto, os gritos pungentes dos que já lutam com elas.

Compreendo, então, que devo atirar-me imediatamente ao mar, para não ser arrastado pelo turbilhão que faria a massa do navio ao submergir. Mas já é tarde demais, porque, estando ele quase horizontal, se eu der um salto, cairei, conforme o lado, sobre o casco ou sobre o convés. Ouço ainda o apito tenebroso do vapor, um apito surdo e contínuo, agonizante, de estertor.

As águas me envolvem violentamente, jogando-me de encontro a uma parede. Depois… sinto que mergulhamos, arrastados pelo navio.

Penso, conformado, na morte: deste mergulho não voltarei, certamente ! Não perco o raciocínio, nem me deixo dominar pelo desespero. Antes me conservo calmo, resignado, enfrentando o desfecho da vida. Continuo a merguIhar, a mergulhar… Quantos metros ? Nem sei ! Sinto nos ouvidos o barulho forte e característico das bolhas de ar, numa escala cromática extravagante, que vai num crescendo do grave para o agudo, à proporção que me aprofundo nas águas… A falta de ar já me tortura; começo a engolir água…

Súbito, porém, paro de mergulhar, e percebo que vou voltando. Mas sou, então, violentamente imprensado entre dois volumosos fardos, e tenho a sensação de que vou ficar esmagado. Inexplicavelmente, não sinto nenhuma dor. Por felicidade, fico de novo livre, e continuo a voltar, aos trancos, à superfície, recebendo pancadas pelo corpo, agora mais rápido — cada vez mais rápido — até que, de repente, dou um salto, saindo-me fora d’água o tronco todo, tal o empuxo.

O navio está completamente submerso. Imagino que não deve ter levado a afundar-se mais de três ou quatro minutos, tornando impossível qualquer providência de salvamento, ou a descida de qualquer das baleeiras.

O mar, violentíssimo, encapelado, está coberto de destroços e, não sei como, ainda caem paus de todos os lados, como estilhaços.

Ouço gritos terríveis, angustiosos, de socorro, e vejo homens, mulheres e crianças se afogando em torno de mim.

Nado um pouco e me agarro a uns paus que flutuam, e que as fortes ondas me arrancam logo das mãos; imediatamente me seguro noutros, mas também não consigo sustê-los, e fico nesse jogo, pulando de uma tábua para outra, durante algum tempo.

Reparo que há sobre as águas duas luzes avermelhadas, como archotes, a iluminar aquela cena macabra: são bóias de iluminação, que se acendem automaticamente, ao contato com a água.

O mar limita-me a visão, e só quando me elevo numa onda melhora o meu horizonte. Em dado momento, avisto com surpresa um projetor lançando seu feixe luminoso sobre o local do sinistro: firmo o olhar e diviso, iluminado pelas luzes que dançam na água, o perfil do submarino assassino, bem próximo de nós, contemplando os resultados da sua bárbara missão ! Em seguida, perco-o de vista…

Estou agora junto de uma grande tábua branca, com aberturas que me parecem janelas: consigo com facilidade deitar-me nela, de bruços, e me sinto mais bem acomodado. Pelo menos descanso um pouco. Mas me agarro com todas as forças, para que as ondas não me arranquem dali.

Perto de mim, alguém grita em desespero, já quase a perder o fôlego:

— Não posso mais, vou desistir…

Animo o companheiro, chamando-o para junto de mim, e isso me dá mais animo! Ele se aproxima, e com algum esforço se agarra à minha tábua: vem ofegante, exausto. Trocamos algumas palavras. É um tripulante do Baependi.

As ondas violentas e o forte vento começam agora a espalhar náufragos e destroços; os gritos dispersos de socorro chegam cada vez de mais longe. Somos também impelidos para longe do local do sinistro, arrastados naquela tábua, em rumo desconhecido.

Conjugando nossos esforços, examinamos o mar em todas as direções. Nada ! Provavelmente nenhuma baleeira pôde ser lançada ao mar. Nossa salvação é provisória, sem dúvida… E ficamos vogando ao sabor das ondas por um tempo difícil de estimar: talvez meia hora, uma hora… Ouvem-se agora menos gritos de socorro: a maioria sucumbiu, desesperada !

Mas, repentinamente, divisamos uma silhueta que não é de um destroço, passando defronte das bóias de iluminação, já bem longe. Parece-nos uma baleeira… Dentro, um vulto, de pé… Não resta dúvida, é uma baleeira ! Mas está muito distante. Para alcançá-la, teríamos que nadar contra o vento e as ondas e, cansados como estamos, isso não nos parece empresa fácil.

Começamos então a gritar, com todas as forças dos nossos pulmões. Grito, grito ! Lembro-me de gritar meu nome, e o faço diversas vezes. Lembrança talvez salvadora: ouvimos, pouco depois, uma resposta que nos pareceu “espera”… Graças a Deus, tinham-nos ouvido, e remam em nossa direção ! Foi o primeiro alento, a primeira sensação de poder sair com vida daquela pavorosa catástrofe.

A baleeira se aproxima. Abandonando a benfazeja tábua, damos umas braçadas, lançam-nos uma bóia presa a uma corda, e somos içados para bordo, onde encontro dois tenentes, dois sargentos e três soldados, da minha unidade. Abraçamo-nos, comovidos, mas poucas palavras trocamos. Pensamos na sorte dos outros camaradas, e não nos conformamos com a idéia de que somos os únicos sobreviventes.

É talvez esta a única baleeira que escapou ao desastre, arrancada dos turcos pela violência da explosão.

Recolhidos mais alguns náufragos, somos ao todo vinte e oito. Entre eles, há uma moça que, mal explodiu o torpedo, lançou-se resolutamente ao mar, nadando, agarrada a um pequeno destroço, durante mais de uma hora!

Mas em que direção ficará a costa? Não podemos orientar-nos com segurança, pois mal se vêem as estrelas, e a escuridão impede-nos de consultar a única bússola, que corria de mão em mão, inutilmente.

Mas entre os náufragos está, felizmente, o piloto do Baependi. Recobrando as forças, ele resolve com simplicidade o problema da navegação, mandando “remar na direção do vento, pois o mesmo soprava para terra”.

Somente na baleeira noto que estou ferido. O sangue jorra abundantemente do meu rosto, e, levando a mão à face direita, percebo que sofri uma fratura. Mas não sinto nenhuma dor.

A pequena embarcação joga como uma casca de noz naquele mar agitado e de vez em quando uma onda mais forte invade-a; um grande rombo da proa aumenta a nossa inquietação; é preciso baldear continuamente a água, tal a quantidade que entra.

O vento é cortante, sentimos um frio tremendo, uma sede desoladora, e o enjôo apodera-se da maioria.

Pouco depois avistamos, não muito longe, um navio iluminado. Ficamos hesitantes: valerá a pena remar na sua direção ? Alcançá-lo-emos ? Desistimos da idéia, o que foi providencial, pois cerca de uma hora depois, ouvimos o eco de uma tremenda explosão, que nos pareceu um trovão longínquo: o navio que passara por nós — o Araraquara, soubemos depois — fora também torpedeado !

Navegamos assim, impelidos pelo vento e pelos remos, durante toda a noite — que nos parece interminável. Os rapazes, incansáveis, se revezam nos remos e os outros no balde de água.

Ao clarear o dia, ainda na penumbra, temos uma explosão de contentamento: a uns dois quilômetros de nós, percebemos a faixa branca de areia de uma praia ! Mais umas remadas, a manobra para vencer a forte arrebentação, e eis-nos em terra firme. Nossos corações pulam de alegria !

A praia, desabitada, é formada por vastas dunas de areia, onde os pés se enterram, agravando nosso cansaço. Caminhamos algum tempo, seguindo uma pequena trilha, até avistarmos uma cabana onde apenas encontramos água.

Felizmente, indicam-nos uma picada que vai ter a uma povoação. Andamos até o meio-dia, ou antes, arrastamo-nos, pois há diversas pessoas feridas, e outras esgotadas. Por sorte encontramos muitos coco-da-baía, cuja água saborosa bebemos sofregamente.

Ao chegarmos à povoação, todas as portas e janelas se batem, violentamente ! “Que teria havido ?” Consultamo-nos, surpresos… Estamos tão embrutecidos, que nos custa a compreender: a nossa nudez quase total ofendeu o pudor da gente da terra ! Um parlamentar, que enviamos em trajes mais decentes, resolve a situação, e recebemos algumas roupas usadas, que nos permitem improvisar tangas.

Depois de alimentados, seguimos de canoa para Estância, no Estado de Sergipe, termo das nossas provações. Ali soubemos, mais tarde, terem chegado à praia, numa pequena balsa de madeira, mais oito náufragos do Baependi. Trinta e seis sobreviventes — eis o que restava !

Quase todos os nossos camaradas tinham sido tragados pelas ondas. E quando um médico, náufrago também, nos relatou o episódio da morte do mais jovem dos nossos companheiros de armas, não pudemos conter as lágrimas. Ao atirar-se ao mar, sem salva-vidas, certo do fim que o aguardava, o Tenente Assunção lançara em voz vibrante este grito derradeiro de patriotismo:

— “Viva o Brasil!”

__________________
O Capitão Lauro Moutinho dos Reis, oficial de artilharia do Exército Brasileiro, fazia parte de uma unidade(7º GAdo) que viajava no Baependi para o Nordeste, quando na noite de 15 de agosto de 1942, o navio do Lóide brasileiro foi atingido por dois torpedos na altura da fronteira entre Bahia e Sergipe, fato que, ao lado dos outros quatro torpedeamentos efetuado pelo U-507, suscitou a onda de revolta nacional que levou o Brasil entrar efetivamente na Segunda Guerra contra as potências do Eixo. Das 323 pessoas que estavam a bordo do Baependi, apenas se salvaram 18 passageiros e 18 tripulantes.

________________

Manisfestação do Povo Contra o Eixo
Portão Principal do 7º GAC

Impressa Nacional
comandante Harro Schacht

Ataque ao U-Boot 507 no início de 1943

Fonte:

http://www.7gac.eb.mil.br/o_regimento.html

http://www.brasilmergulho.com

A Agressão Alemã Contra o Brasil

Figurou por muitos anos a tola menção de que os navios torpedeados na costa brasileira era fruto inevitável de submarinos aliados com o objetivo de incriminar deliberadamente a Alemanha, e forçar a entrada no Brasil na Segunda Guerra Mundial. Evidentemente essa teoria nunca se sustentou, muito embora ainda haja pessoas que acreditam em tão fraco argumento.

A convite do então Ministério da Marinha, o Almirante Jorgen Horhwer esteve no Brasil e, no dia 28 de março de 1982, na Escola de Guerra Naval, pronunciou uma conferência intitulada “Operações navais da Alemanha”. O Almirante, que combateu na marinha alemã durante a Segunda Guerra Mundial, relatou de forma precisa como os submarinos de seu país torpedearam navios brasileiros. O depoimento histórico abrange todas as operações navais realizadas nesta parte do oceano atlântico, do início ao fim das hostilidades, e foi publicado na íntegra, no número 18 da revista Navegator.

 

Vamos verificar abaixo um resumo de algumas atividades das operações submarinas da marinha alemã na costa brasileira a partir de 1942.

Semanas antes do afundamento do Lacônia, precisamente no dia 7 de agosto de 1942, Doenitz tomou uma decisão que mudaria a História Contemporânea do Brasil: o U-507 recebeu por rádio a mensagem para usar “manobras livres” na costa brasileira. De modo que o submarino comandado pelo capitão-de-fragata Harro Schacht então com 35 anos, afundou cinco navios brasileiros de cabotagem nos litorais da Bahia e Sergipe, acarretando a morte de mais de 600 pessoas, inclusive de mulheres e crianças. Diga-se agora e a bem da verdade que a grande mortandade ocorrida nos afundamentos do Baependi, Araraquara, Anibal Benevolo foi devido ao tipo de ataque devastador desfechado pelo comandante Schacht, ou seja, sem prévio aviso e lançando dois torpedos um após outro, levou aqueles navios ao fundo em questões de minutos e isso debaixo de uma noite escura e de um mar revolto. Em outras palavras, a maioria dos tripulantes e passageiros não tiveram a oportunidade de abandonar os navios devido ao rápido afundamento. Tudo indica que as ordens dadas a Schacht era o de causar o maior número de vítimas fatais. Para se ter uma idéia da dimensão da tragédia cometida pelo U-507, somente uma baleeira do Baependi, com apenas 28 sobreviventes atingiu a costa no dia seguinte. E apenas oito náufragos, agarrados em destroços de madeira, lograram alcançar a terra dois dias após o ataque. Portanto, das 305 pessoas que estavam a bordo do famoso navio do Lloyd Brasileiro, pereceram 269. Já entre os 142 ocupantes do Araraquara, 131 morreram. Tanto pior ocorreu com o Anibal Benevolo, pois morreram todos os seus 83 passageiros e apenas quatro dos 71 tripulantes, sobreviveram. Foi uma matança sem igual, porquanto até fins de julho de 1942, a Marinha Mercante brasileira de longo curso tinha perdido onze navios com 135 vítimas fatais.
Esse massacre ocorrido em águas territoriais brasileiras, provocou grande consternação entre o povo brasileiro. A indignação foi geral. Em várias cidades houve violentas manifestações populares contra súditos do Eixo e suas propriedades. Tanto o governo autoritário do Estado Novo quanto a opinião pública que vivia manietada pelo DIP, consideraram indispensável uma reação. O Brasil seria lançado definitivamente na infernal Segunda Guerra Mundial. No Rio de Janeiro, a notícia, divulgada no dia 18, desencadeou uma série de passeatas e comícios populares, onde os cariocas exigiam retaliação. No fim da tarde, uma massa popular se dirigiu para o Palácio do Itamaraty – sede do Ministério das Relações Exteriores – clamando pelo chancelar Oswaldo Aranha, que apareceu na sacada do edifício para exclamar: “A situação criada pela Alemanha, praticando atos de beligerância, bárbaros e desumanos contra a nossa navegação pacífica e costeira, impõe uma reação à altura dos processos e métodos por eles empregados contra oficiais, soldados, mulheres, crianças e navios do Brasil. Posso assegurar aos brasileiros que me ouvem, como a todos os brasileiros, que, compelidos pela brutalidade da agressão, oporemos uma reação que há de servir de exemplo para os povos agressores e bárbaros, que violentam a civilização e a vida dos povos pacíficos.”
Mas em verdade o Brasil naquele momento estava longe de ser um país pacífico. Vide o que a FAB estava fazendo em maio de 1942, ao atacar os submarinos italianos que estavam posicionados ao longo da costa nordeste brasileira.

As memórias equivocadas de Doenitz

É bem verdade que em agosto de 1942, o Brasil já estava em beligerância não declarada com o Eixo, mas sobre o nefasto acontecimento que chocou o Brasil, Doenitz, em suas memórias veio escrever: “Finalmente, havia a possibilidade de operações ao largo da costa do Brasil. Nossas relações políticas com aquele País vinham há já algum tempo cada vez mais se deteriorando e as ordens emitidas pelo Alto Comando Naval referentes à nossa atitude para com a navegação brasileira se agravaram em correspondência(…)Depois que o Brasil rompeu relações diplomáticas, seus navios continuaram a ser tratados da mesma maneira que os de todos os outros Estados neutros, desde que fossem reconhecidos e agissem como neutros, de acordo com a Convenção Internacional. No entanto, entre fevereiro e abril de 1942, os U-boats torpedearam e afundaram sete navios brasileiros, com todo direto de fazê-lo de acordo com o estabelecido na Convenção de Praças de Guerra( Prize Ordenance), desde que os capitães dos U-boats não puderam reconhecer suas identidades de neutros. Estavam navegando sem luzes em curso de zigue-zague, alguns deles armados e alguns pintados de cinza e nenhum deles ostentava uma bandeira ou signo de sua identidade de neutro. Depois disso mais e mais navios brasileiros montaram canhões até que toda sua Marinha Mercante estava armada.(…)No fim de maio, o Ministro da Aeronáutica brasileiro anunciou que um avião brasileiro tinha atacado submarinos do Eixo e que continuaria a fazê-lo. Sem nenhuma declaração formal, achamo-nos assim num estado de guerra com o Brasil, e a 4 de julho os U-boats receberam permissão dos nossos líderes políticos de atacarem todo os navios brasileiros. Na primeira semana de julho, quando estávamos planejando as primeiras operações dilatadas de U-boats, perguntei ao Ministro do Exterior se haveria alguma objeção às planejadas operações ao largo do estuário do Rio da Prata, área de reunião para os navios-frigoríficos que eram tão importantes no suprimento de carne da Inglaterra. Sem considerar a opinião da Argentina, o Ministro do Exterior negou permissão para qualquer operação ao largo das costas daquele País, mas não fez objeção à continuação de nossas atividades ao largo do Brasil, que haviam sido permitidas em maio e que estavam em progresso desde então. Decidi portanto mandar, em associação com as operações planejadas contra o tráfego de navios Norte-Sul ao largo de Freetow, mais um barco para a costa brasileira. Do outro lado do estreito entre a África e a América do Sul, o U-507(Tenente-Comandante Schacht) estava operando. Ali fora das águas territoriais, ele afundou cinco navios brasileiros. Nisto ele agia de acordo com as instruções expedidas, com a cooperação do Ministro do Exterior, pelo Quartel-General das Forças Armadas. O Governo brasileiro tomou o afundamento destes navios como ocasião para declarar guerra à Alemanha. Embora isto não tivesse em nada alterado nossas relações existentes como o Brasil, que já havia tomado parte em atos hostis contra nós, foi sem dúvida um erro levar o Brasil a uma declaração oficial; politicamente deveríamos ter sido melhor aconselhados para evitar tal fato. O U-boat Command, porém, e o capitão do U-boat envolvido, como membros das Forças Armadas, não tinham senão que obedecer as ordens que lhe haviam sido dadas; não competia a eles pesar e calcular as conseqüências políticas…”

CONTUDO

Primeiro é preciso que se diga que certas informações fornecidas acima por Doenitz não correspondem com a verdade. Os três primeiros navios comprovadamente afundados pelos nazi-fascistas(Buarque, Olinda e Cabedelo, 14, 16 e 25 de fevereiro de 1942, respectivamente), navegavam com as luzes de bordo e de navegação acesas, assim como estavam iluminadas as bandeiras do costado e da popa, bem como a chaminé que identificava a nacionalidade e a companhia proprietária. Foi depois dessas iniciativas da parte da ressentida Alemanha contra os interesses brasileiros, que o governo do Estado Novo junto com autoridades navais norte-americanas, tomaram medidas para tentar evitar que os barcos fossem afundados tão facilmente. Assim, o terceiro a ser atacado, o Arabutan, estava pintado de cinza, navegava às escuras e sem bandeira. E foi após a perda do Cairu ao largo da costa leste dos EUA, o qual veio gerar a morte de 53 pessoas, que os navios mercantes brasileiros começaram a ser dotados de um sistema de defesa, dispondo tão-somente de uma peça de artilharia( O Parnaíba, o quinto navio torpedeado em 1-5-42, trazia na popa um canhão de 120mm) Entrava-se numa dialética de ação e reação de atos de beligerância. O Comando da Marinha alemã solicitou a Hitler que fossem levantadas as restrições para o ataquue a navios brasileiros(vistoria e ordem de abandono), no que foi atendido. Daí por diante, os navios brasileiros seriam considerados beligerantes e torpedeados sem aviso. Mas bem antes disso, o governo de Getúlio Vargas havia protestado perante a Alemanha através do embaixador português em Berlim, que transmite em 27 de fevereiro o seguinte: “devem cessar os atos da Marinha de Guerra alemã contra os navios mercantes sem defesa, e que pertencem a um país que não está em guerra.” Mas a Alemanha hitlerista não levou em conta esses protestos.

 

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